“A segunda dose da vacina nos livra da Covid-19. O que nos livrará dos ‘Bolsovírus’ será o impeachment ou o seu voto em 2022.” Com essa frase na camiseta, o professor Luiz Carlos de Oliveira, 61, e a pedagoga Dirlene de Oliveira, 61, foram no posto nesta segunda-feira (12) para aplicar o imunizante.
Na primeira dose, em abril, a camiseta era mais direta: “Vacina sim, Bolsonaro fora”, mas o casal conseguiu tomar a AstraZeneca no quartel do Corpo de Bombeiros na Barra da Tijuca, na zona oeste do Rio de Janeiro.
Dessa vez, no entanto, ouviram de um soldado que não poderiam ser imunizados fazendo protesto político.
“Estávamos na fila e ele veio confirmar o cartão e a identidade. Muito gentilmente informou que a ordem do comando era de não vacinar quem estivesse com camisa, cartaz ou qualquer mensagem política”, conta Luiz Carlos. “Ele disse que a gente podia ir no banheiro e virar a camisa do avesso. Eu virei ali mesmo e minha esposa tirou a dela já que estava com outra por baixo.”
Os dois estranharam a mudança. “Na primeira vez também fiz a camisa e nos vacinamos normalmente, no mesmo lugar, com as mesmas pessoas. Pode parecer bobagem, mas vivi a ditadura [militar] e senti o mesmo cheiro no ar dos anos 1970, 1980”, afirmou Luiz Carlos.
O professor diz que seu direito à liberdade de expressão foi cerceado. “Se eu tivesse com uma camisa apoiando o Bolsonaro, provavelmente teria sido vacinado. Me senti voltando 50 anos na história. É um sentimento de retrocesso”, afirma ele, que tem ido aos protestos que reinvidicam o impeachment do presidente, em meio às acusações de propina e de demora para a compra das vacinas.
O casal não é o único. O avanço da imunização tem multiplicado o número de pessoas com camisetas, placas e máscaras com mensagens contra o governo Bolsonaro e o negacionismo.
O modelo estampado com as frases “A terra não é plana. Vacinas funcionam. Nós fomos à Lua. Aquecimento global é real. Defenda a ciência” foi o mais vendido na categoria feminina do produto no site da Amazon no início de julho.
Outra versão que tem sido vista nas filas dos postos de vacinação é “Eu viro jacaré, mas não viro gado #forabolsonaro”.
Luiz Carlos se infectou um mês antes de receber a primeira dose do imunizante. Viu sua irmã ser intubada por causa da Covid e perdeu amigos.
“O medo da pandemia e os efeitos do vírus são realmente devastadores. Só quem passa pela doença sabe. Para mim, está evidente que a vacina poderia ter chegado antes e em maior quantidade”, diz.
Ele conta que vestiu a mensagem para “chamar atenção das pessoas para a CPI, que está demonstrando uma série de facetas do governo que deveria levar a um processo de impeachment. Outra forma de mudar é o voto em 2022, que as pessoas votem com consciência”. Como diz Chico Buarque, emenda o professor, “vai passar”.
Procurada, a Secretaria municipal de Saúde, sob gestão de Eduardo Paes (PSD), primeiro afirmou que os questionamentos deveriam ser encaminhados para o Corpo de Bombeiros, órgão responsável pela operacionalização do posto, e vinculado ao governo do estado.
Questionada novamente, por ser a responsável pela campanha de vacinação na capital, a pasta afirmou que “repudia a atitude contra qualquer tipo de manifestação, desde que pacífica, no ato da vacinação”.
“A secretaria já aplicou mais de 4,6 milhões de doses de vacinas contra Covid e, até o momento, não há qualquer tipo de queixa ou registro de censura em suas unidades, e trabalhará para que atitudes como essa nunca aconteçam”, disse, em nota.
O Corpo de Bombeiros e o governo do estado, sob gestão de Cláudio Castro (PL), não responderam à reportagem até esta publicação.
(BHAZ)