Num passado não tão distante, a Record TV enfrentou uma forte crise em sua dramaturgia desde Máscaras (2012). Todas as novelas que vieram em seguida sofreram com a rejeição do público e sambou em vários horários na programação da emissora. Em 2015, a emissora do bispo Edir Macedo apostou todas as suas gfichas na primeira trama bíblica do ramo, Os Dez Mandamentos.
Escrito por Vivian de Oliveira e dirigido por Alexandre Avancini, a história de Moisés, Nefertari e Ramsés se tornou um grande marco e inovou na teledramaturgia brasileira. Sendo um fenômeno em audiência e repercussão, Os Dez Mandamentos conseguiu um feito histórico: vencer uma trama global da faixa das 21h00, neste caso, A Regra do Jogo.
Com rios de dinheiro enchendo os cofres, a Record TV se acomodou e apostou num filão desse gênero. Nesse meio, a apresentadora e futura herdeira do canal, Cristiane Cardoso deu a sua assinatura na segunda temporada de Os Dez Mandamentos em 2016 e não parou mais. Em A Terra Prometida (2016-2017), a protagonista Aruna (Thaís Melchior) sofreu uma abrupta mudança de personalidade, de guerreira à uma mocinha frágil, esta foi a primeira intervenção de Cardoso que culminou a demissão do autor Renato Modesto. Por sorte, o mesmo não se aplicou em O Rico e Lázaro (2017).
No final de 2017 estreou a trama bíblica e contemporânea Apocalipse. Escrita por Vivian de Oliveira com direção de Edson Spinello, sofreu inúmeras intervenções de Cristiane Cardoso que se intrometia no texto, na edição e fez com que Sérgio Marone narrasse os primeiros capítulos. O que afugentou definitivamente o público foi a forçada amostra do Stéfano Nicolazzi (Flávio Galvão), como um papa falso profeta e gerou uma enorme revolta entre os católicos. Sofrendo boicotes, ameaças e aborrecida com as mudanças, Vivian de Oliveira se desligou da emissora e atualmente vive com a família nos Estados Unidos.
Antes mesmo de estrear, Gênesis estava sendo escrito por Gustavo Reiz que saiu pelo mesmo motivo da sua colega citada no trecho acima, assim como aconteceu com Emílio Boechat que nem quis ver o seu nome creditado na abertura como força de protesto. Com rumos duvidosos, a autora Gisele Joras e Marcílio Moraes não tiveram seus contratos renovados com a RecordTV.
Evangelização nas contemporâneas
Para quem assistiu Chamas da Vida, Caminhos do Coração, Vitória dentre outros títulos que abocanhou o público que não sintonizavam na TV Globo, atualmente vão estranhar a nova era na histórias contemporâneas. Canceladas por falta de planejamento da emissora, finalmente Topíssima saiu do papel, porém tem o nome da poderosa chefona Cristiane Cardoso creditado na abertura.
Segundo vários veículos de comunicação, a comédia romântica escrita por Cristiane Fridmann foi baseado no livro da filha de Edir Macedo, Casamento Blindado, no entanto, toda essa bravata não passou de boatos. A própria autora deixou claro que os conflitos de Sophia e Antônio tem bases na peça teatral A Megera Domada, de William Shakespeare.
Na conjuntura da história, Cardoso deixou algumas mensagens subliminares: Nos takes do Morro do Vidigal, aparecia rapidamente uma Igreja Universal do Reino de Deus, os personagens assistiam tramas bíblicas, sem contar na espera de Gabriela (Rafaela Sampaio) perder a virgindade após o casamento – Alguns costumes antigos foram implementados na surdina pela supervisora de texto.
No ano seguinte, Fridmann estreia Amor Sem Igual que no seu decorrer virou palanque explícito da IURD. A personagem Poderosa carregou com si toda a novela, mas falhou miseravelmente nos últimos capítulos com uma mudança e conversão forçada. A ex-prostituta ganhou como presente de Miguel, uma bíblia sagrada – Esta cena foi comemorado por muitos e revoltou outros que viram isso como uma doutrinação cênica. Além disso, a trama ganhou recursos extras com os takes de São Paulo que mostrava o Templo do Salomão, a Maria Antônia assistindo The Love School para tentar conquistar o verdudeiro a todo custo e as roupas comportadas das prostitutas.
Após engatilhar a mal sucedida Belaventura nas tardes, Cristiane Cardoso voltou a atacar no horário nobre e num acordo comum vão lançar Quando Chama o Coração. Em meio a protestos, a série canadense terá séries juvenis da IURD como sua substituta. Recentemente, outros autores saíram do casting do canal, Paula Richard e Camilo Pellegrini. Com a herdeira interferindo e impondo costumes bíblicos em histórias contemporâneas, as tramas da Record TV acabou retrocedendo e perdendo sua identidade. Pena, uma emissora que tem tudo para ser uma segunda potência na dramaturgia ser estragado por mero capricho.
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